sábado, 1 de novembro de 2008

O 403


Como sempre de terça-feira uma de minhas amigas passa na minha casa lá pelas 6:30 para irmos para o plantão de anestesio. Nesta terça não foi diferente.Quando chegamos no hospital não encontramos nada de interessante no centro cirúrgico, apenas uma cesária que já tinha começado e como fazemos o plantão de anestesio não havia mais nenhum procedimento a ser realizado. Decidimos, então, fazer o plantão junto com um amigo, já formado, que faz residência em cirurgia geral e assim deu ínicio a nossa noite.Vimos que em suas mãos haviam quatro pedidos para passar intracath e uma paracentese, ficamos um tanto quanto empolgadas. Fomos até o quarto do paciente com ascite e quando interrogadas a respeito de quem o ajudaria com o procedimento fui logo levantando a mão. Fui um tanto quanto estabanada, calcei as luvas estéreis de forma correta, mas confeço que me estranhei com a seringa, parecia até que nunca tinha visto tal coisa antes.Fiz um botão anestésico e parti para punção. Ocorreu tudo bem e fomos então para o que realmente nos interessava.Subimos até o terceiro andar para passar o intracath e estávamos ansiosas para ouvirmos novamente a pergunta do procedimento anterior. Pensavamos na melhor maneira de responder mais rápido do que a outra. Ao chegarmos no local constatamos que a enfermeira já tinha conseguido pegar o acesso venoso periférico, não havendo mais a necessidade de um acesso central. Protocolamos a informação e fomos para o segundo andar.Chegando no segundo andar, percebemos que o procedimento já tinha sido realizado, apenas não tinha sido protocolado devido a falhas no sistema. Novamente protocolamos a situação.Fomos para o próximo paciente e para nossa decepção era um quarto particular (estudante não coloca a mão). A familía percebeu que só havia um médico ali, ele pediu para os familiares aguardarem na ante sala e começou o procedimento.Cututa aqui, cutuca ali, “o tórax é muito alto”, “não quero no meu pescoço, doutor”, jugular, subclavia, “calor aqui, né?” e a ultima palavra que eu ouvi saindo da boca da minha amiga foi: Chris....E pronto, já estava no chão. A paciente ficou assustada com o barulho e apertou minha mão tão forte como se isso fosse resolver alguma coisa. Chris é um aluno do quinto ano que rapidamente levantou a minha amiga e a levou para fora.Sai imediatamente, fui saber como ela estava e pedi para que o Chris voltasse para o quarto. A família, por sua vez, me abordou com um olhar de superioridade e foi logo me metralhando com perguntas: Qual sua função aqui? Quanto tempo demora esse procedimento? Por quê ela saiu do quarto carregada? Como está minha mãe?”Respirei fundo, era meu primeiro contato direto com familiares, tentei organizar o monte de informações confusas que eu tinha na minha cabeça e saiu assim:A sua mãe está bem. O procedimento está sendo realizado, a punção de um acesso venoso central pode ser simples porém em alguns casos onde a anatomia é diferenciada pode demorar um pouco mais, a sua mãe tem um tórax alto e a agulha não alcança a veia subclavia, ela não quer que puncione a veia jugular no pescoço. Fiquem tranquilos e aguardem um pouco mais.Achei que com isso estava livre de responder qual era a minha função no hospital e o pior, explicar o possível desmaio da minha colega. Virei as costas e um sorriso de alívio se esboçou em meu rosto, mas foi interrompido: Por quê mesmo sua amiga saiu carregada?A colera tomou conta de mim, virei-me lentamente tentando encontar naqueles poucos segundos a resposta. Falar do desmaio era o mesmo que afirmar a nossa falta de experiência. Tive que mentir dizendo que ela tinha tropeçado e torcido o pé.Logo em seguida o procedimento terminou e eu estava isenta da primeira pergunta. Fomos chamar a enfermeira para fazer o curativo e quando passamos pelo corredor um sorriso sarcástico na porta do quarto 403 disse: Você desmaiou, né? Queridinha!Correspondemos com o mesmo sorriso sarcástico e tentamos explicar o inexplicável.Para terminar o dia passamos no drive true do Mc Donald’s. Nada me tira da cabeça que a culpada de tudo aquilo foi a fome.

O amado




Não pode existir nada pior que o fim de um amor
Despedíamos-nos todos os finais de semana, mas a despedida do final foi como um punhal em meu peito.
Saber que aquele amigo, aquele companheiro nunca mais me ligaria, nunca mais me beijaria me doeu como nunca havia doido.
As amizades que criamos devido à aproximação com a pessoa amada se vão, se perdem no ar.
E o mundo que é tão pequeno fica tão grande quando há o desejo de reencontrar a pessoa amada.
E o que me resta são apenas bons pensamentos que não sei se habitam somente a mim.
E o que me resta e me mata é vontade de querer saber, por isso peço ao meus pensamentos que por favor se ponham longe de mim.

domingo, 19 de outubro de 2008

conquistas


Já fui chata, já fui legal demais e já fui eu mesma também. Acho que não deu certo. Na conquista somos quem queremos ser - honestos, amigos, sinceros, humanos. Cada um escolhe seu tipo, cada hora veste uma roupa, cada vez uma armadilha. E assim, vale tudo. Vale dizer um trecho de um livro ou a letra de uma música, vale roubar a cena, ser um ator, um poeta um autor. Vale fingir gostar de estrelas, de ganhar flores de ficar em casa vendo um filme e comendo pipoca. Vale acordar cedo, correr no parque, andar de bicicleta, ver uma exposição de arte ou uma peça de teatro. Vale pegar um trem, vale ir de metro, vale gostar de rock, pop, reggae e hip hop. Vale viajar para um lugar estranho, dançar na chuva, beber um pouco e depois da conquista, não vale mais nada, ficamos tão nós mesmos que fica tudo muito chato.

O defensor

Dia cheio... Parei para almoçar às 4 horas da tarde com uma amiga, nesse horário o que nos restava era somente fast food. Como precisava subir a serra para passar o final de semana com minha família, peguei um lanche (desses que vem com picles, acompanhados por fritas e refrigerante) e parei em um dos canais que cortam a cidade de Santos.
Esfomeada comecei a devorar o meu almoço quando minha amiga, como sempre mais atenta do que eu, chamou-me a atenção para o que estava acontecendo do outro lado do canal.
Quando direcionei o meu olhar vi um carro esportivo, enorme, com um ferro na frente e um pneu atrás tentando entrar em uma vaga que nem o menor dos carros populares caberia, no entanto esse não era o problema para aquele motorista.
Insanamente ele começou a entrar na vaga e a empurrar os outros carros. Comecei a buzinar, mas o infeliz não parava, achei que o rádio pudesse estar alto, porém quando ele bateu no carro pela sétima vez me veio à certeza de que se tratava de um completo otário.
Quando ele desceu do carro a minha fúria era tanta que aposto que se ele soubesse pensaria muito antes de agir por simples reflexo.
Eu: Ei! Você viu o que você fez?
Ele: Você está falando comigo?
Eu: Você se acha muito esperto, não é mesmo? Você acaba de bater em dois carros populares com o seu humilde carro e tem coragem de agir como se nada tivesse acontecido.
Ele: Você é proprietária de um desses carros?
Eu: Claro que não, mas nem por isso saio por ai quebrando tudo o que não me pertence
Dei o assunto por encerrado, mas ele ainda balbuciou algumas palavras.
Era um sujeito imponente, cheio de razão e que queria me convencer do contrário.
Eu: Com certeza deve ser advogado!
Não demorou muito e este rapaz estava na janela do meu carro querendo continuar a discussão.
Ele: Você tem alguma coisa contra advogados?
Nessa ora senti todos os meus músculos esfincterianos se contraírem
Eu: claro que não, toda minha família é formada em direito e eu sou acadêmica.
O detalhe é que ninguém da minha família é formada em humanas e me esqueci de dizer que era acadêmica de medicina, mesmo com um puta adesivo na traseira do meu carro.
Nessa hora esbocei um sorriso de alívio e ele correspondeu dizendo que era defensor público e que poderia me ajudar caso eu precisasse. Despedimos-nos e quando acabei de comer meu lanche fiz questão de parar ao lado do carro dele e espalhar todo o meu lixo no para brisa junto a um bilhete: “ao defensor público que não defende o patrimônio alheio”.